segunda-feira, 8 de junho de 2015

Testamento espiritual de Alessandro Serenelli (1882-1970)

Talvez nunca tenha ouvido falar de Maria Teresa Goretti (hoje Santa Maria Goretti depois de ser canonizada pelo Papa Pio XII) e muito menos de Alessandro Serenelli mas vale a pena conhecer e meditar um pouco sobre a vida destas duas almas e de como a conversão e o perdão podem vir das formas mais impensáveis e terríveis.
Não aprofundarei os dados biográficos dos intervenientes por não vir ao caso, falarei apenas do incidente que os uniu e de que forma veio a influenciar o futuro de Alessandro. Ele era um jovem robusto de 20 anos ela uma jovem de 11, não se sabe o que terá passado pela mente do jovem mas perdeu-se de desejo pela menina e numa manhã em que a pequena Maria Teresa se encontrava sozinha em casa entrou na cozinha e tentou violá-la ameaçando-a de morte como a jovem não se submetia gritando-lhe que parasse, que era um pecado grave o que estava a cometer e que seria condenado ao Inferno Alessandro apunhalou-a 11 vezes soltando-a, Goretti ainda tentou alcançar a porta de saída mas sem sucesso, recebeu ainda 3 punhaladas antes do agressor fugir, a família e vizinhos alertados pelos gritos da jovem e o choro da irmã Goretti mais nova acorreram a casa onde a encontraram estendida no chão ensanguentada. Foi submetida a tratamento médico sem anestesia e apesar de sua Fé acabou por falecer olhando para um quadro de Santa Cecília e Santa Inês suspirando: “Eu te perdo-o, quero ver-te comigo no Paraíso”. Estas foram segundo a tradição as suas últimas palavras. O criminoso foi apanhado e condenado em cúmulo jurídico a 30 anos de reclusão, tivesse ele 21 anos (maioridade legal na altura) e teria sido condenado à prisão perpétua. Ao princípio Alessandro não mostrava qualquer sinal de arrependimento nem pudor mesmo quando o bispo da sua cidade o visitou no cárcere para lhe falar do evangelho de Cristo. Alguns dias mais tarde mostrou-se muito perturbado e pediu para falar com o bispo, tinha sonhado com Marietta a sua vítima que trazia 14 lírios (tantos quantas as punhaladas) e sorria-lhe resplandecente. Assim começou a sua conversão. A caminhada foi dura, teve de combater as suas más inclinações, chorou muito e por diversas vezes levado pelo remorso e a culpa pensou suicidar-se mas a certeza do perdão da pequena Maria Goretti e as suas últimas palavras: “Quero vê-lo comigo no Paraíso”, foram um incentivo para prosseguir na sua conversão. No Natal de 1934 visitou a Srª Assunta Goretti mãe de Maria Teresa para lhe pedir perdão, a nobre senhora respondeu que já o havia perdoado há muito tempo e para espanto de toda a vila foram juntos à missa do galo. Mantiveram contacto ao longo dos anos, juntos viram Maria Teresa ser elevado aos altares com o nome de Santa Maria Goretti em 1950 e Alessandro esteve presente junto de Assunta quando está já doente morreu. Alessandro viveu no convento dos frades Capuchinhos de Marerata trabalhando como porteiro, zelador e jardineiro, vivendo uma vida de reclusão e oração até à data de sua morte a 6 de Maio de 1970. O assunto central deste post é o testamento espiritual de Alessandro Serenelli escrito numa idade avançada e encontrada num envelope fechado após a sua morte, o texto foi publicado na Madre di Dio. Mensile Mariano (Novembro 2002), tendo eu utilizado a tradução de Pablo Cervera Barranco na revista Religión en Libertad para fazer a minha tradução para português que agora publico: Sou um velho de quase 80 anos, em breve terminarei meus dias. Deitando um olhar sobre o passado, reconheço que na minha primeira juventude percorri um caminho falso, a via do mal que conduziu à ruína. Via tudo através da imprensa, os espectáculos e os maus exemplos que seguem a maioria dos jovens sem nem sequer pensar. Eu fiz o mesmo. Não me preocupava. Pessoas crentes e praticantes tive perto de mim, mas não lhes prestava atenção, cego por uma força brutal que me empurrava para um mau caminho. Aos 20 anos cometi o crime passional de que hoje me horrorizo só de recordar. Maria Goretti, agora santa, foi o anjo bom que a Providencia havia colocado ante os meus passos para guiar-me e salvar-me. Tenho ainda gravadas no meu coração as suas palavras de compaixão e de perdão. Rezou por mim e intercedeu pelo seu assassino. Seguiram-se trinta anos de prisão. Se não fosse menor de idade, teria sido condenado a prisão perpétua. Aceitei a merecida condenação. Expiei a minha culpa. A pequena Maria foi verdadeiramente a minha luz, minha protectora. Com a sua ajuda, portei-me bem nos meus últimos 27 anos de carcere e tentei viver honradamente quando a sociedade me aceitou de novo entre os seus membros. Os Irmãos de São Francisco, os Capuchinhos das Marcas, acolheram-me com caridade seráfica no seu mosteiro não como servo mas como um irmão e com eles convivi desde há já 24 anos. Agora espero sereno o momento de ser admitido na visão de Deus, de abraçar os meus seres queridos de novo e de estar junto do meu anjo protector y sua querida mãe, Assunta. Os que leiam esta carta, oxalá queiram seguir o feliz ensinamento de fugir do mal e seguir sempre o bem. Penso que a religião com os seus preceitos não é coisa que se possa menosprezar, senão que é o verdadeiro consolo, o único caminho seguro em todas as circunstâncias, até nas mais dolorosas da vida. Paz e Bem! Alessandro Serenelli